Biblioteca em fogo – Wikipédia, a enciclopédia livre

Biblioteca em fogo
(imagem nas páginas web da Europeana e da FCG)
Autor Helena Vieira da Silva
Data 1974
Técnica Pintura a óleo sobre tela
Dimensões 158,4 cm × 178,4 cm 
Localização Museu Calouste Gulbenkian, Lisboa

A Biblioteca em fogo é uma pintura a óleo sobre tela criada em 1974 pela pintora portuguesa da moderna escola de Paris Helena Vieira da Silva (1908-1992) e que pertence à coleção do Museu Calouste Gulbenkian, em Lisboa.

O título desta pintura pode ser entendido metaforicamente como aludindo ao incêndio da Biblioteca de Alexandria e, sobretudo, à paixão e inflamação da imaginação e da razão que a leitura desperta, tendo, em abril de 2016, sido seleccionada como uma das dez mais importantes obras artísticas de Portugal pelo projeto Europeana.[1]

Linhas de força predominantemente verticais e horizontais, acrescidas de algumas diagonais, constroem uma composição fortemente ritmada, acrescida de cores quentes, predominantemente vermelhos e ocres, e subtilíssimos efeitos de luz e transparências.[1]

Como outros elementos construtivos, o grande formato do suporte também foi considerado, estando a tela imperceptivelmente cosida de alto a baixo a meio da pintura unindo duas partes iguais. Um quadriculado ocupa toda a superfície, com um tratamento diferente nos quadrados lisos da moldura, sendo mais elaborado e gráfico na parte interna. A pintura divide-se em superfícies aparentemente regulares, sendo os quadrados da parte central subdivididos em dois ou quatro, confundindo-se a grelha com a quadrícula. A luminosidade e o tratamento diferente entre o centro e o exterior produz um obscurecimento da parte central, sugerindo profundidade e concentração do espaço. A variabilidade da cor e da luz realçam a importância das margens, tendo com perícia e minúcia notáveis sido doseados para obter um efeito de profundidade ilusório. A cor também tem um papel fundamental na definição de cada área da obra, sendo o vermelho do fogo a cor predilecta das Bibliotecas de Vieira da Silva, evocando intimismo e os espaços interiores.[2]

A obra integra-se na temática das bibliotecas que Vieira da Silva periodicamente tratou, mas sem uma preocupação de série, antes desenvolvendo ou reelaborando as obras em várias direcções. Em 1949, uma primeira Biblioteca foi o início de um novo tipo de concepção espacial, recriando a perspectiva clássica numa multiplicação de pontos de fuga. Noutra pesquisa da definição do espaço e numa fase mais matura do percurso da Artista, A Biblioteca em fogo (La Bibliothèque en feu) constitui outro exemplo notável de estruturação do espaço, tendendo a grelha a suplantar a perspectiva.[2]

Para Rui Afonso Santos, Vieira da Silva, amiga de intelectuais, artistas e escritores, manifesta nesta obra muito conhecida uma espécie de testamento espiritual. Antiga aluna de Léger e, sobretudo, de Bissière, afirmou-se como artista destacada da chamada Segunda Escola de Paris, na medida em que atingiu o milagre pictórico de, a partir de linhas de força verticais, horizontais e diagonais, por vezes num efeito de quadrícula, dotar a Abstração de tridimensionalidade.[1]

Já para Marina Bairrão Ruivo, Vieira da Silva sempre evocou a importância da biblioteca da casa do avô materno onde viveu na sua infância e juventude. Educada em casa, para a jovem Maria Helena a imaginação e os livros eram apoios poderosos no combate à solidão e na descoberta do mundo. A biblioteca foi sempre uma referência fundamental na vida e obra da artista, pelo carácter mágico e misterioso que lhes estão associados, tendo sido representada inúmeras vezes como metáfora dos universos que encerra. Mas o entendimento da pintura de Vieira da Silva não se cinge a uma mera análise iconográfica. Os temas que ressurgem ao longo do tempo não interferem por si só na essência da obra: um tabuleiro de xadrez, ou uma cidade, podem assumir o papel de uma biblioteca, uma gare, ou uma estante, na pesquisa da espacialidade e na expressão do seu mundo imaginário.[2]

E para Eduardo Lourenço, "a Biblioteca de Vieira da Silva não é fantástica, no sentido em que o seria um quadro com semelhante título de Paul Klee, cuja pintura é realmente a mais fantástica que se conhece, mas apenas recriadora – em nós – do “fantástico” de uma Biblioteca, entre outros possíveis, que afinal é pouca coisa comparado à fascinação pura do espelhismo ambíguo e múltiplo do quadro, em suma, à pura música espacial que o constitui".[3]

Sobre Helena Vieira da Silva na página web da Ulysseias:[4]

  • AA. VV.[5] (2010), Abstracção. Arte Partilhada, Lisboa, Fundação Millenium bcp.
  • AA. VV. (2011), A Vez e a Voz da Mulher em Portugal e na Diáspora, Califórnia, University of the California.
  • AA. VV. (2010), Longos dias têm cem anos. Vieira da Silva: um olhar contemporâneo, Lisboa, Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa.
  • Azevedo, F. (1988), Vieira da Silva o longínquo desastre. Colóquio Artes, n.º 77, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, pp. 14-16.
  • Bell, C. (2009), Arte, Lisboa, Edições Texto & Grafia.
  • Calzetta, J. (2006), Vieira da Silva, Paris, Cercle d’art.
  • Dirthey, W. (1994), Sistema de Ética, S. Paulo, Ícone.
  • França, José-Augusto. (1958), Vieira da Silva, Lisboa, Artis.
  1. a b c Página da Europeana, [1]
  2. a b c Nota de Marina Bairrão Ruivo em Maio de 2010 sobre a obra na página web da Fundação Calouste Gulbenkian, [2]
  3. Blog do Projecto Edição Obras Completas de Eduardo Lourenço(www.eduardolourenco.uevora.pt), financiado pela Fundação Calouste Gulbenkian, [3]
  4. Página do ILCML - Instituto de Literatura Comparada Margarida Losa, Faculdade de Letras da Universidade do Porto, [4]
  5. AA. VV. - Autores Vários

Ligação externa

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