Maaiana – Wikipédia, a enciclopédia livre

Imagem em relevo do bodisatva Kuan Yin, no Monte Jiuhua, na República Popular da China; os diversos braços da imagem representam a capacidade e o compromisso sem limites do bodisatva em ajudar os outros seres.

Maaiana,[1] mahayana,[2] magnaiana[3] ou Caminho para Muitos[3] (em sânscrito: महायान, transl. mahāyāna, "grande veículo") é um termo classificatório utilizado no budismo que pode ser usado de três maneiras diferentes:

  • Como tradição viva, o maaiana é a maior das duas principais tradições do budismo existentes hoje em dia, a outra sendo o teravada.
  • Como ramo da filosofia budista, o maaiana se refere a um nível de prática e motivação espiritual,[4] mais especificamente ao Bodhisattvayana[5] A alternativa filosófica é o hinaiana, que é o yana ("caminho") de Arhat.
  • Como caminho prático, o maaiana é um dos três yanas, ou caminhos para a iluminação, os outros dois sendo o teravada e o vajrayana.

As raízes do nome mahayana são polêmicas[6] e têm sua origem num debate sobre quais seriam os reais ensinamentos do Buda.[7] Embora o movimento maaiana trace suas origens a Gautama Buda, as evidências históricas indicam que ele se originou no século I a.C.[3] ou no século I d.C. no Sul da Índia.[8] Foi levado para a China por Lokaksema, primeiro tradutor dos sutras maaianas para o chinês.

A primeira menção ao maaiana ocorre no Sutra do Lótus, entre o século I a.C. e o século I.[9] As primeiras escrituras maaianas provavelmente se originaram durante o século I, no subcontinente indiano e se espalharam para a China durante o segundo século.[10] Apenas no século V, o maaiana se tornou uma escola influente na Índia.[11] No decorrer de sua história, o maaiana se espalhou pelo Leste da Ásia. Os principais países no qual ele ainda é praticado são a China, o Japão, a Coreia e o Vietnã.

Alguns dos principais sutras maaianas, codificados para sânscrito, não sobreviveram com o tempo e se perderam.[12] As versões que foram traduzidas posteriormente para o tibetano e o chinês sobreviveram.[12] As principais escolas do budismo maaiana que possuem um número significativo de seguidores são o budismo tibetano, o zen-budismo, a Terra Pura, o Nichiren, o Shingon e o Tendai.

Poucas coisas podem ser ditas com certeza sobre o budismo maaiana, especialmente sobre suas primeiras formas, indianas, além de que é a forma de budismo praticada na China, no Vietnã, Coreia, Tibete, Nepal[3] e Japão e de que sua língua canônica é, principalmente, o sânscrito.[3][13][14] O maaiana pode ser descrito como um feixe atado de maneira pouco firme, de diversos ensinamentos, que conseguiu englobar as diversas e contrastantes ideias encontradas naqueles diversos ensinamentos dos elementos que o compõem.[15]

O maaiana é uma estrutura religiosa e filosófica vasta. Constitui uma inclusiva, caracterizada pela adoção de novos sutras, os chamados sutras maaianas, em adição aos textos mais tradicionais, como o Cânone Páli e os ágamas, e por uma mudança nos conceitos e no propósito básico do budismo. O maaiana se vê como capaz de penetrar mais profundamente no darma de Buda. No Nirvana Sutra (ou Mahaparinirvana Sutra), por exemplo, o Buda narra como seus primeiros ensinamentos sobre o sofrimento, a impermanência e o não eu foram dados àqueles que ainda eram como "pequenas crianças", incapazes de digerir a "refeição" completa da verdade. À medida que estes estudantes espirituais "fossem crescendo" e não mais se satisfizendo com os ingredientes preliminares da refeição dármica com que se alimentavam e precisassem de maior sustância, estariam, então, prontos a assimilar os ensinamentos do maaiana em toda a sua totalidade.

O escola maaiana do budismo retira a ênfase no ideal, expresso pelo teravada, da libertação do dukkha (sofrimento) individual, e na obtenção do nirvana (extinção). O Sutra do Lótus diz, por diversas vezes, que a vida do Buda é extremamente longa, e que ela é infinita; as autoridades do maaiana divergem sobre qual destas afirmações deve ser interpretada literalmente. De uma maneira geral, os chineses e japoneses preferem a primeira, enquanto os tibetanos a última. Além disso, a maioria das escolas do maaiana acredita num panteão de bodisatvas (em sânscrito: बोधिसत्त्व), quase-divinos, que se devotam à excelência pessoal, ao conhecimento supremo e à salvação da humanidade e de todos os outros seres sencientes (animais, fantasmas, semideuses etc.). O zen-budismo é uma escola do maaiana que, frequentemente, retira a ênfase no panteão dos bodisatvas e, ao invés disso, se foca nos aspectos meditativos da religião. No maaiana, o Buda é visto como o ser definitivo, mais elevado, presente em todos os tempos, em todos os seres, e em todos os lugares, enquanto os bodisatvas representam o ideal universal da excelência altruística.

Os princípios fundamentais da doutrina maaiana foram baseados em torno da possibilidade da liberação universal do sofrimento para todos os seres (daí "grande veículo") e na existência de budas e bodisatvas que incorporam a natureza de Buda (em chinês: 佛性) transcendente (a eterna presença do Buda, presente, porém escondida e irreconhecível, em todos os seres). Algumas escolas do maaiana simplificam a expressão de fé permitindo que a salvação seja obtida através da graça do buda Amitaba (अमिताभ), tendo fé e se devotando ao nianfo (cânticos a Amitaba). Este estilo de vida devoto do budismo é especialmente enfatizado pelas escolas da corrente Terra Pura, e contribuiu enormemente ao sucesso do maaiana no Leste da Ásia, onde os elementos espirituais tradicionalmente se utilizavam de cânticos com o nome de um buda, de mantras ou dharanis, da leitura de sutras maaianas e do misticismo. No budismo chinês, a maioria dos monges pratica a Terra Pura, alguns combinando-a com o Chan (Zen).[16]

Há uma tendência, nos sutras maaianas, de encarar a aderência a estes textos como forma de obter benefícios espirituais maiores do que aqueles que seriam obtidos pelos seguidores das visões não maaiânicas do darma. Assim, no Srimala Sutra, o Buda afirma que a devoção ao maaiana é inerentemente superior em suas virtudes à devoção ao caminho do Sravaka ou do Pratyekabuddha:

" ...assim como, no gado, a magnificência do mais bem criado e belo brilha mais que o resto do rebanho em altura, peso e assim por diante, também sustentar o Saddharma [Verdadeiro Darma] do maaiana, ainda que somente um pouco, é algo maior e mais vasto que todos os saudáveis darmas dos yanas [veículos] do Shravaka e Pratyekabuddha."[17]

Referências

  1. http://www.academia.org.br/abl/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=23
  2. Foundation for the Preservation of the Mahayana tradition(em inglês)
  3. a b c d e Darmapada: a doutrina budista em versos. Tradução de Fernando Cacciatore de Garcia. Porto Alegre, RS. L&PM Editores. 2010. p. 35.
  4. Harvey, Introduction to Buddhism, Cambridge University Press, 1990, pág. 94
  5. "O Mahayana, "Grande Veículo" ou "Grande Carruagem" (para carregar todos os seres ao nirvana) também é, e talvez mais correta e precisamente, conhecido como o Bodhisattvayana, o veículo do bodisatva." (Ver Indian Buddhism, A. K. Warder, 3rd edition, 1999, p.338)
  6. "A escola posterior que se arrogou o título de 'Mahayana'." Indian Buddhism, AK Warder, 3ª edição 1999, pág. 4
  7. "É certo que o termo Mahayana (que significa "grande ou amplo veículo") era originalmente um rótulo polêmico utilizado apenas por um dos lados - e talvez pelo menos significante deles - num debate arrastado, e talvez mesmo desigual, a respeito de quais seriam os reais ensinamentos do Buda". (Ver Macmillan Encyclopedia of Buddhism, 2004, pág. 492)
  8. "O próprio movimento maaiana alega ter sido fundado pelo próprio Buda. O consenso obtido pelas evidências, no entanto, é de que ele se originou no Sul da Índia no primeiro século depois de Cristo." Indian Buddhism, AK Warder, 3rd edition, 1999, pág. 335.
  9. Theravada - Mahayana Buddhism Ven. Dr. W. Rahula Theravada - Mahayana Buddhism
  10. "A evidência mais importante - na verdade, a única evidência - para se situar a emergência do maaiana no início da era comum não vem da Índia, e sim da China. Já no último quarto do segundo século depois de Cristo existia uma coleção pequena, aparentemente idiossincrática, de sutras maaianas significativas, traduzidos para o que Erik Zürcher chama de "chinês quebrado", por um indo-cita cujo nome indiano foi reconstruído como Lokaksema." Macmillan Encyclopedia of Buddhism, 2004, pág. 492
  11. "Temos, seguramente, para este período, um corpus significativo de inscrições de virtualmente todas as partes da Índia. ... Porém em nenhuma parte deste extenso material existe qualquer referência, antes do quinto século, a algo ou alguém chamado Mahayana. Existem, por outro lado, diversas referências aos grupos que costumavam ser chamados de Hinayana - os sarvastivadinas, os mahasamghikas, e assim por diante. Por este ponto de vista, pelo menos, este não foi "o período do maaiana", e sim "o período do hinaiana".", Macmillan Encyclopedia of Buddhism, 2004, pág. 493
  12. a b Mahayana (Encyclopædia Britannica 2002)
  13. "Existem, ao que parece, poucas coisas que podem ser ditas com certeza sobre o budismo maaiana", Macmillan Encyclopedia of Buddhism, 2004, pág. 492
  14. "Mas além do fato de que pode-se dizer, com alguma certeza, que o budismo existente na China, Coreia, Tibete e Japão é o budismo maaiana, não se sabe com clareza o que mais pode ser dito com alguma certeza sobre o próprio budismo maaiana, especialmente sobre o seu período anterior, presumivelmente formativo, na Índia.", Macmillan Encyclopedia of Buddhism, 2004, pág. 492
  15. "Tornou-se cada vez mais claro que o budismo maaiana nunca foi uma coisa, e sim, ao que parece, um feixe atado de maneira pouco firme, de muitas coisas, e - como Walt Whitman - era amplo e podia conter, nos dois sentidos do termo, contradições, ou pelo menos elementos antípodas.", Macmillan Encyclopedia of Buddhism, 2004, pág. 492
  16. Welch, Practice of Chinese Buddhism, Harvard, 1967, pág. 396
  17. The Shrimaladevi Sutra, tradução para o inglês por Shenpen Hookham, Longchen Foundation, Oxford 1998, pág. 27
  • «Mahayana». Encyclopædia Britannica. Encyclopædia Britannica. 2002 
  • Paul Williams, Mahayana Buddhism, Routledge, 1989
  • Schopen, G. "The inscription on the Kusan image of Amitabha and the character of the early Mahayana in India", Journal of the International Association of Buddhist Studies 10, 1990
  • ”The Vision of the Buddha”, Tom Lowenstein, ISBN 1-903296-91-9
  • Kevin Lynch, The Way Of The Tiger: A Buddhist's Guide To Achieving Nirvana, Yojimbo Temple, 2005
  • Beal, Catena of Buddhist Scriptures from the Chinese, (London, 1871)
  • S. Kuroda, Outline of Mahayana, (Tokyo, 1893)
  • D. T. Suzuki, Outline of Mahayana Buddhism, (London, 1907)
  • Murdoch, History of Japan, volume I., (Yokohama, 1910)
  • D. T. Suzuki, em The Monist, volume XXIV, (Chicago, 1914). The Monist was edited by Paul Carus.

Ligações externas

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