Guarda Negra (Brasil) – Wikipédia, a enciclopédia livre
Guarda Negra | |
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Datas das operações | 1888 - 1889 |
Líder(es) | José do Patrocínio |
Motivos | Defender a recém-conquistada liberdade dos negros e proteger o bem-estar da princesa Isabel |
Área de atividade | Império do Brasil |
Ideologia | Abolicionismo, Monarquismo, Isabelismo |
Efetivo | 1 500[1] |
Ataques célebres | Ataques a comícios republicanos |
Status | Extinta |
Inimigos | Republicanos |
A Guarda Negra da Redentora foi uma instituição que surgiu nos meses que se seguiram após a abolição da escravidão no Brasil, formada por ex-escravos que tinham como objetivo proteger a liberdade recém adquirida bem como o bem-estar da princesa Isabel, como um gesto de agradecimento pela libertação deles.
História
[editar | editar código-fonte]A existência do grupo é tido por historiadores como um episódio de características únicas na história do Brasil.[1] Segundo a pesquisadora Clícea Maria Augusto de Miranda, a Guarda Negra se revela uma grande interrogação para a historiografia uma vez que desafia os modelos interpretativos tradicionais sobre o escravismo, visto que a guarda era uma instituição formada majoritariamente por libertos, oriundos dos extratos mais subalternos da sociedade, direcionada para a proteção de D. Isabel, figura emblemática da realeza.[2]
O embrião da sociedade se deu quando o jornal "Cidade do Rio" de José do Patrocínio publicou, em 6 de junho de 1888, um convite da “Liga dos Homens de Cor” e convidando a afiliação de recém-libertos. O mesmo periódico noticiou posteriormente que havia sido criada a “(...) associação que, com o título de Guarda Negra da Redentora, se dedicasse em corpo e alma e em todos os terrenos à defesa do reinado da excelsa senhora que os fez cidadãos.”[3]
A instituição foi formada em 9 de julho de 1888 e dissolvida logo após a queda do império. Era composta por ex-escravos que foram libertados com a promulgação da Lei Áurea de 13 de maio de 1888. A guarda foi organizada pelo abolicionista José do Patrocínio.[2] Não possuía uma estrutura hierárquica ou fardas. Era uma irmandade de negros gratos pela abolição e dispostos a dar a vida pela princesa Isabel. Eles se reuniam na rua da Carioca e na rua Barão de Guaratiba, no Catete - entre outros endereços.[1] Há poucas informações bibliográficas em torno da formação e organização da Guarda Negra, sendo restrita à matérias jornalísticas da época e de republicanos que eram alvos de sua ação. De uma maneira geral são análises superficiais e esparsas.[2] Na época, a Guarda Negra chegou a ser comparada a um bando de capoeiras a serviço do governo imperial e também de sociedade secreta.[4]
Teorias sobre a formação e objetivos
[editar | editar código-fonte]O chefe-geral da guarda Clarindo de Almeida disse o seguinte sobre a mesma: "O nosso fim não é levantar o homem de cor contra o branco, mas restituir ao homem de cor o direito que lhe foi roubado de intervir nos negócios públicos."[1]
Antônio da Silva Jardim considerava a Guarda Negra uma instituição ilegal que fora criada simplesmente para assegurar a integridade de D. Pedro II e de D. Isabel, garantindo-lhes o status quo. Para ele a conivência do império com a instituição era evidenciada pelo fato de que João Alfredo Correia de Oliveira, à época primeiro-ministro do Brasil, manifestava apoio a guarda. Além disso considerava como uma de suas diretrizes a divisão de raças.[5] Mesma impressão tinha seu colega político Medeiros e Albuquerque que tinha aversão a José do Patrocínio demonstrando certo preconceito racial ao mesmo de acordo com seus comentários.
Para Medeiros e Albuquerque a instituição era uma ideia concebida pelo Chefe de Polícia Coelho Bastos para proteção de D. Isabel contra os republicanos. Segundo ele a polícia acionava a Guarda e "os incitava a perturbar os meetings republicanos dando-lhes sempre fuga quando eram apanhados."[6]
O escritor Osvaldo Orico tinha outra visão da Guarda Negra. Para ele a formação se deu pela inspiração de seu líder José do Patrocínio, baseando no seu histórico de luta pela abolição da escravidão no Brasil.[7] Porém na sua visão da Guarda possuía um mecanismo ambíguo: ao mesmo tempo que a instituição lutava contra o crescimento do movimento republicano tecia-lhes argumentos para combater as instituições imperiais, aumentando a pressão dos adversários da monarquia.[8]
Conforme o relato de testemunhas oculares da época os membros da guarda dissolviam comícios organizados por políticos republicanos, chegando ao ponto de alguns deles portarem revólveres para segurança pessoal.[9]
Fim
[editar | editar código-fonte]A principal causa do fim da Guarda Negra foi a Proclamação da República, ocorrida em 15 de novembro de 1889. O regime recém-formado havia criminalizado a capoeira com a criação do Código Penal republicano de 1890 em seu artigo 402, e as elites vinculavam constantemente a Guarda à visão estereotipada em relação ao negro através da capoeira.[10] O novo regime perseguia os membros da guarda e cuja perseguição era liderada pelo chefe de polícia João Batista Sampaio Ferraz. Eles foram detidos e encaminhados a prisão de Santa Cruz para depois serem enviados para um presídio em Fernando de Noronha. O destino final dos membros da guarda é incerto. Existe a teoria de que muitos deles foram admitidos na marinha, que era reconhecidamente monarquista e essa admissão, aliada aos maus tratos, levaram ao episódio da história brasileira conhecida como Revolta da Chibata.[1]
Diretrizes e Estatuto
[editar | editar código-fonte]Segundo o publicado no periódico Cidade do Rio após a criação do grupo, as diretrizes e o estatuto da instituição eram:[11]
- Criar uma associação com o fim de opor resistência material a qualquer movimento revolucionário que hostilize a instituição que acabou de libertar o país.
- Só poderão fazer parte, como seus sócios ativos, os libertos que se comprometerem a obedecer os mandatos de uma Diretoria eleita, por maioria absoluta, em votação que se efetuará em momento oportuno.
- Poderão ser sócios efetivos unicamente os que considerem o ato memorável do dia 13 de maio, acontecimento digno de admiração geral e não motivo para declarar guerra à humanitária princesa que o realizou.
- Pedir à Confederação Abolicionista o seu apoio para que esta sociedade se ramifique por todo o império.
- Pedir à imprensa que participe desse sentimento o seu valioso concurso.
- E último. Aconselhar por todos os meios possíveis aos libertos do interior que só trabalhem nas fazendas daqueles que não juraram guerrear o 3.º Reinado.
O jornal de José do Patrocício defendia constantemente a Guarda, publicando no dia 5 de janeiro de 1889 uma matéria em que declarava a intenção não-violenta do grupo: [2]
"É necessário que fique bem claro que essa congregação de homens agradecidos é a conseqüência lógica das bravatas publicadas nos manifestos dos seus exsenhores, e que o fim a que se propuseram, reunindo-se era e é provar ao país que com os seus corpos fazer uma muralha capaz de receber as balas que os neo-republicanos dirijam à sua redentora. É preciso que se saiba bem, que a Guarda Negra se organizou para resistir e não atacar."
Ver também
[editar | editar código-fonte]Referências
- ↑ a b c d e Guimarães, Saulo Pereira (13 de maio de 2016). «Negros, libertos e monarquistas -». Vozerio. Consultado em 29 de novembro de 2018
- ↑ a b c d Miranda 2011, p. 1.
- ↑ Fernandes Machado, Humberto (2013). «Abolição e Cidadania: a Guarda Negra da Redentora no Rio de Janeiro» (PDF) 3 ed. Revista Internacional de História Política e Cultura Jurídica. 5: 505-524
- ↑ Machado 1992, p. 171.
- ↑ Jardim 1891, p. 227.
- ↑ Albuquerque 1933, p. 123.
- ↑ Miranda 2011, p. 5.
- ↑ Orico 1977, p. 195.
- ↑ Miranda 2011, p. 4.
- ↑ Dias, Luiz Sérgio (2001). Quem tem medo da Capoeira? Rio de janeiro, 1890-1904. Rio de Janeiro: Secretaria Municipal das Culturas/Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro. pp. 80–81
- ↑ MIRANDA, Clícia Maria Augusto (2006). Guarda Negra da Redentora: Verso e Reverso de uma Combativa Associação de Libertos. Rio de Janeiro: UERJ. p. 48
Bibliografia
[editar | editar código-fonte]- Albuquerque, José Joaquim de Campos da Costa de Medeiros (1933). Minha vida da Infância a Mocidade – Memórias. Rio de Janeiro: Calvino Filho Editor
- Jardim, Antônio da Silva (1891). “Memórias e viagens”.. Campanha de um propagandista (1887-1889). Lisboa: Tip. Da Companhia Nacional Editora
- Machado, Humberto (1992). «A Guarda Negra no contexto urbano do Rio de Janeiro». Porto Alegre. Anais da XII Reunião da Sociedade Brasileira de História
- Miranda, Clícea Maria Augusto de (2011). «Memórias e Histórias da Guarda Negra: verso e reverso de uma combativa organização de libertos.» (PDF). São Paulo. Anais do XXVI Simpósio Nacional de História
- Orico, Osvado (1977). O tigre da abolição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira