Iconoclastia – Wikipédia, a enciclopédia livre
Iconoclastia ou Iconoclasmo (do grego εικών, transl. eikon, "ícone", imagem, e κλαστειν, transl. klastein, "quebrar", portanto "quebrador de imagem") é uma rejeição de imagens religiosas (pinturas, ícones, estátuas).
Foi também um movimento político-religioso contra a veneração de ícones e imagens religiosas no Império Bizantino que começou no início do século VIII e perdurou até ao século IX.[1] Os iconoclastas acreditavam que as imagens sacras seriam ídolos, e a veneração e o culto de ícones por consequência, idolatria.
Em oposição à iconoclastia existe a iconodulia ou iconofilia (do grego que significa "venerador de imagem"), ao qual defende o uso de imagens religiosas, "não por crer que lhes seja inerente alguma divindade ou poder que justifique tal culto, ou porque se deva pedir alguma coisa a essas imagens ou depositar confiança nelas como antigamente faziam os pagãos, que punham sua esperança nos ídolos [cf. Sl 135, 15-17], mas porque a honra prestada a elas se refere aos protótipos que representam, de modo que, por meio das imagens que beijamos e diante das quais nos descobrimos e prostramos, adoramos a Cristo e veneramos os santos cuja semelhança apresentam.[2]
Em 730, o imperador Leão III, o Isauro proibiu a veneração de ícones. O resultado foi a destruição de milhares de ícones pelos iconoclastas, bem como mosaicos, afrescos, estátuas de santos, pinturas, ornamentos nos altares de igrejas, livros com gravuras e inumeráveis obras de arte. O iconoclasmo foi oficialmente reconhecido pelo Concílio de Hieria de 754, apoiado pelo imperador Constantino V e os iconófilos severamente combatidos, especialmente os monges. O concílio não teve a participação da Igreja Ocidental e foi desaprovado pelos papas, provocando um novo cisma. Posteriormente a imperatriz Irene, viúva de Leão IV, o Cazar, em 787 convocou o Segundo Concílio de Niceia, que aprovou o dogma da veneração dos ícones, e recuperou a união com a Igreja Ocidental. Os imperadores que governaram após ela — Nicéforo I e Miguel I Rangabe — seguiram com a veneração. No entanto, a derrota de Miguel I na guerra contra os búlgaros em 813, levou ao trono Leão V, o Arménio, que renovou a iconoclastia.
Durante a regência da imperatriz Teodora, o patriarca de Constantinopla e iconoclasta João VII foi deposto, e em seu lugar erguido o defensor da veneração Metódio I. Sob a sua presidência em 843, ocorreu outro concílio, que aprovou e subscreveu todas as definições do Segundo Concílio de Niceia e novamente excomungou os iconoclastas. Ao mesmo tempo foi definido (em 11 de março, data da reunião do concílio em 843) a proclamação da memória eterna da ortodoxia e o anatematismo contra os hereges, ainda realizada na Igreja Ortodoxa atualmente como o "Domingo da Ortodoxia" (ou "Triunfo da Ortodoxia").
Antecedentes iconoclastas
[editar | editar código-fonte]Registros das comunidades cristãs primitivas, especialmente das catacumbas, indicam que estes representavam Jesus com imagens e iconografias, como um peixe, cenas bíblicas, e outros ícones representando santos e anjos.[4] Nos dois primeiros séculos há poucas esculturas e estátuas, uma vez que elas eram mais difíceis de confeccionar, e custavam mais caro. Mas a partir do século III surgem diversos exemplos de seu uso pelos fiéis.[4] Os cristãos também oravam pelos mortos e acreditavam na intercessão dos santos,[5][6] essas práticas eram conhecidas por alguns antigos grupos judeus, e especula-se que o cristianismo pode ter tomado a sua prática similar. Diversos Padres da Igreja atestam esta doutrina.[7] No século IV, as basílicas e os demais templos cristãos eram comumente decorados com ícones e mosaicos nas paredes. Nessa mesma época, Basílio, o Grande, bispo da Cesareia (atual Kayseri) referindo-se ao mártir Barlaam, incentiva os artistas a retratar a vida de um santo. São João Crisóstomo também escreveu sobre a distribuição de imagens de São Melécio de Antioquia e Teodoreto de Ciro, e relata que retratos de São Simeão eram vendidos em Roma.[8]
Apesar deste apoio a representação de pessoas santas e acontecimentos da história bíblica e eclesiástica, no mesmo período, surgem as primeiras objeções contra o uso de ícones. Por exemplo, Eusébio de Cesareia fala negativamente sobre o desejo da irmã do imperador ter um ícone de Cristo.[carece de fontes] Epifânio ao ver na igreja um véu com a imagem de um homem, rasgou-o e o deu para cobrir o caixão de um mendigo.[carece de fontes] Na Espanha, o Sínodo de Elvira (início do século IV) aprovou uma resolução contra as pinturas murais em igrejaː[8]
“ | As pinturas nas igrejas e o que é retratado nas paredes não são, e não devem ser objeto de culto e adoração. | ” |
Até o início do século VI surgiram outras posições iconoclastas, devido à expansão do monofisismo. O líder monofisista Severo de Antioquia era contra os ícones de Cristo, da Virgem Maria, dos santos e até mesmo a imagem do Espírito Santo como uma pomba. Apesar da amplitude desse movimento, surgiram diversos santos e outras personalidades a favor da veneração de ícones, como Anastácio do Sinai, que escreveu em defesa dos ícones, e Simeão Estilita, o Moço queixou-se ao Imperador Justiniano II de ofender os "ícones do Filho de Deus e da Santíssima e Gloriosa Virgem".[8] Em algumas regiões, no final do século VI e início do século VII houve fortalecimento da iconoclastia, como em Marselha, em que o bispo Soren em 598 destruiu todos os ícones da igreja, o Papa Gregório Magno escreveu a ele sobre isso, elogiando o zelo para a luta contra a superstição, mas exigiu que os ícones fossem restaurados, uma vez que os fiéis eram pessoas comuns, em vez de livros, à congregação compreendia o verdadeiro caminho através dos ícones.[8]
O crescimento da iconoclastia surgiu especialmente em áreas do império que faziam fronteira com os territórios dos árabes do Islã (que eram hostis a imagens). Nesses locais o sincretismo também originou diversas outras heresias cristãs, tais como o montanismo e marcionismo. Uma vez que os seguidores do Islã consideravam ícones ilegais, os imperadores bizantinos, buscando uma convivência pacífica com os muçulmanos, fizeram concessões iconoclastas. Assim, o imperador Filípico antes de sua expulsão em 713, aprovou uma lei contra a veneração dos ícones.[8]
Causas da iconoclastia
[editar | editar código-fonte]Pesquisadores[quem?] apontam as principais causas da iconoclastia em dois grupos:
- Associação com o judaísmo e o Islã: Através da iconoclastia os imperadores bizantinos desejam destruir um dos principais obstáculos para a aproximação cristã com os judeus e muçulmanos, que possuem uma atitude negativa para com os ícones, assim facilitando a subordinação dos povos do império que professavam essas religiões.[9]
- A luta contra a influência da igreja: Até o século VIII, a influência da Igreja no império cresceu substancialmente, havendo um aumento significativo na quantidade de propriedades da Igreja e dos mosteiros. Por esta razão, os imperadores iconoclastas desejavam desviar recursos humanos e dinheiro da igreja para o Estado. Uma vez que a influência econômica dos mosteiros provinha principalmente da confecção de imagens, foi proibida sua fabricação e veneração,[10] bem como muitas propriedades e mosteiros foram confiscados.[9]
Perseguição
[editar | editar código-fonte]A destruição de ícones, mosaicos e afrescos
[editar | editar código-fonte]Os iconoclastas em muitas regiões queimaram os ícones nas paredes dos templos, destruindo mosaicos e afrescos, bem como livros com temas cristãos. Um dos casos mais conhecidos de vandalismo foi a destruição da decoração da Igreja de Santa Maria de Blaquerna.[11] Uma obra da época sobre o assunto dizia: "… os ícones foram jogados — uns no pântano, outros — no mar, e outros — no fogo (…).".[12]
Perseguição e morte de iconófilos
[editar | editar código-fonte]“ | Muitos chefes e soldados caluniaram o culto dos ícones, e comandaram várias execuções, e brutais torturas. Ele obrigou todos em seu reino a jurarem não cultuar ícones, e Constantino fez até o patriarca (…), subir ao púlpito, e (…) jurar que ele não acredita nos devotos dos santos ícones. Ele convenceu-o junto com outros monges, que [comemoravam] comendo carne e estando presente na mesa real com canções e danças. | ” |
— Narração de incidente iconoclasta segundo a tradição popular Cronograma de Feofana (766 anos). |
O assédio dos iconoclastas em primeiro lugar, afetou o monaquismo bizantino: Constantino V publicamente tomou partido da iconoclastia, assim seus partidários maltrataram e perseguiram monges: "… muitos monges morreram golpeados por chicotes e até por espadas, incontáveis ficaram cegos, em alguns foi jogado cera e óleo na barba, e foi colocado fogo nela e, assim, foi queimado o rosto e cabeça. Depois de muitas torturas outros foram mandados para o exílio".[8] Em uma das perseguições contra iconófilos, antes de sua execução, os monges foram forçados a comparar seus templos com o templo de Diocleciano.[13] Em 25 de agosto de 766, vários iconófilos foram publicamente ridicularizados e 19 dignitários foram punidos.[14] Várias das vítimas da perseguição mais tarde foram canonizadas (por exemplo, André de Creta e outros).
Ver também
[editar | editar código-fonte]Referências
- ↑ Иконоборчество. http://slovari.yandex.ru/dict/bse/article/00029/11700.htm?text=иконоборчество. Большая Советская Энциклопедия. издательство = Советская энциклопедия. 1969 — 1978
- ↑ Denzinger, Henrici; Hünermann, Petrus, Enchiridion symbolorum, definitionum et declarationum de rebus fidei et morum (Compêndio dos símbolos, definições e declarações de fé e moral), ISBN 978-85-15-03439-0. Verifique
|isbn=
(ajuda), versão portuguesa brasileira em 2007, Paulinas, pp. 460 (Denzinger-Hünermann [*1823); - ↑ «Análise dos símbolos religiosos». Compreender - Revista Cristã de Reflexão. Consultado em 18 de Outubro de 2008 [ligação inativa]
- ↑ a b «Veneration of Images». Catholic Encyclopedia; New Advent. Consultado em 9 de novembro de 2010
- ↑ Gerald O' Collins and Mario Farrugia, Catholicism: the story of Catholic Christianity (Oxford: Oxford University Press, 2003) p. 36; George Cross, "The Differentiation of the Roman and Greek Catholic Views of the Future Life", in The Biblical World (1912) p. 106; cf. Pastor I, iii. 7, also Ambrose, De Excessu fratris Satyri 80
- ↑ George Cross, "The Differentiation of the Roman and Greek Catholic Views of the Future Life", in The Biblical World (1912) p. 106
- ↑ Gerald O'Collins and Edward G. Farrugia, A Concise Dictionary of Theology (Edinburgh: T&T Clark, 2000) p. 27.
- ↑ a b c d e f Карташёв А. В. Вселенские соборы. Клин. 2004. pg. 574, 575, 576, 577, 601.
- ↑ a b Васильев А. А. Глава 5, раздел 4. Религиозные противоречия первого периода иконоборчества. История Византийской империи. 1. http://www.kulichki.com/~gumilev/VAA/vaa152.htm
- ↑ História Global Brasil e Geral. Volume único. Gilberto Cotrim. ISBN 978-85-02-05256-7
- ↑ Попова Ольга. Эпоха иконоборчества 730-843 гг. Византийские иконы VI—XV веков. http://nesusvet.narod.ru/ico/books/popova/popova2.htm
- ↑ Страдание святого преподобномученика Стефана Нового
- ↑ Карташёв А. В.,
- ↑ Хронография Феофана, год 6257 / 757 (766)