Sistema elu – Wikipédia, a enciclopédia livre

O sistema elu faz parte de um conjunto de propostas linguísticas criadas com o propósito de introduzir na língua portuguesa um género gramatical neutro, sendo a proposta de maior destaque os neopronomes pessoais e suas contrações elu, delu, nelu, aquelu, equivalentes aos pronomes femininos e masculinos existentes na língua, porém neutros em género.

A língua portuguesa por regra determina que o plural dos substantivos, quando abrange indivíduos do género feminino e masculino, é feito com base no masculino. Esse tipo de formação do plural é considerada sexista por certos grupos e indivíduos,[1][2] daí resultando propostas por uma linguagem neutra a ser adotada. Falantes de línguas com géneros gramaticais masculino e feminino (p.ex. português, espanhol, francês) tendem a ter pensamentos mais sexistas, perante a perspectiva estrangeira e lugar de fala exógenos.[3][4][1]

O uso de pronomes pessoais neutros, como hen em sueco, elle em espanhol e they singular em inglês, ajudam a combater o sexismo.[5][6][7][8] O sistema tem por objetivo de criar uma linguagem neutra para comunicar sobre as pessoas não-binárias e diminuir a discriminação de gênero.[9]

Outros ajustes do sistema

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O sistema elu se estende também à neolinguagem, logo, usa neologismos para substituir palavras que adequem uma neutralidade ou epicenidade, acompanhando uma mudança de gênero noutras funções, adjetivos e substantivos.[10][11]

Uma grande parte das palavras sofre flexão de género, o movimento altera a palavra mediante o género.[9] Esta alteração de género ocorre quando se troca a desinência nominal das palavras, sendo esse o nome das letras que ficam na parte final dessas palavras. Essa trata e indica especialmente o género.[9] Um exemplo, são as vogais “-a” ou “-o”, que estão no final de várias palavras com flexão de género (menin-A, menin-O).[9]

Além dessas vogais, existem também outros tipos mais elaborados de desinências nominais, e que variam quando as palavras estão no singular e plural.[9]

Para além do neopronome "elu", existem outras normas para a possibilidade da neutralidade de género na língua: como quando a palavra termina em “-o” no masculino ou “-a” no feminino, substituir-se a desinência por “-e” (ex: lindo, linda = linde), quando a palavra termina em “-co” no masculino e “-ca” no feminino, substituir-se a desinência por “-que” (ex: médico, médica = médique), ou ao terminar em “-go” no masculino e “-ga” no feminino, substituir-se a desinência por “-gue” (ex: amigo, amiga = amigue),[12] assim como a substituição dos pronomes possessivos “meu(s)” ou “minha(s)” por “minhe(s)” ou “mi(s)”,[13] ou dos artigos definidos “a(s)” e “o(s)” por “ê(s)”, entre outras mudanças.[14]

As alterações são somente válidas para se tratar de pessoas. O tratamento para objetos permanece o mesmo, não perdendo o seu género gramatical original. Os pronomes “isto”, “isso” e “aquilo” cujo género gramatical é masculino se mantêm. Os adjetivos e complementos devem também manter a concordância com o género gramatical do sujeito, sendo um erro esses elementos não concordarem em género.[9]

Algumas pessoas usam e-circunflexo ou acento agudo em “elu”: “élu” para replicar o som de “e” em ela; “êlu” para reproduzir a pronúncia de “e” em ele,[15] e “elú” para destacar uma forma distinta ou que enfatiza a letra “u”.[16]

História do sistema e uso

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O sistema surgiu num contexto de críticas sobre o uso de “x” ou “@” neolinguisticamente no lugar de “a” ou “o” não funcionar na linguagem oral,[17][18] servindo somente na escrita, mas não para ler, falar ou ouvir,[17] e críticas sobre esse uso discriminar pessoas com deficiências visuais ao atrapalhar aquelas que utilizam de programas de leitura através de som, e pessoas disléxicas, outras alternativas tornaram-se necessárias.[17][19]

Com a criação de "elu", por volta dos anos 2010, houve outras tentativas de pronomes neutros, como o “el” e “ilu” (que surgiu a partir do pronome neutro do latim illud, e que deu base para o “elu”).[20] Outras propostas,[21] surgiram, como alternativas a "elu".[22][23][24] O sistema também foi replicado em galego.[25][26][27]

Em junho de 2020, mês do orgulho LGBT+, a página oficial do Facebook app fez uso neolinguístico do sistema em "juntes", numa postagem do Dia dos Namorados, lives e capa, em alternativa a "juntos" e "juntas".[28]

Este sistema já é usado pela associação portuguesa de jovens LGBTI e apoiantes da Rede Ex Aequo,[16] em personagens não-binárias da série da HBO "Todxs Nós",[29] em vídeos do canal do YouTube da Google Brasil,[30] apareceu em notícias televisivas brasileiras[31] e é usado por várias pessoas não-binárias e outras no seu dia a dia.[32][33]

O pronome pessoal de Adira, personagem na terceira tempora de Star Trek: Discovery, é o they singular[34][35] e sua tradução inicial, tanto na dublagem quanto na legenda, acabou sendo eles. A Netflix posteriormente relegendou e redublou, trocando por elu e desinências em ⟨-e⟩, visto que um pronome singular não pode ser traduzido por um plural.

Durante os Jogos Olímpicos de Verão de 2020, a narradora Natália Lara e o comentarista Conrado Santana, da SporTV, usam o sistema elu para se referir a Quinn, na partida de futebol feminino entre Canadá e Japão.[36]

Jornal da USP também já utilizou sistema de neolinguagem para se referir a pessoas de ascendência asiática, como as armênia, árabe ou indiana. A palavra "árabes" foi inicialmente flexionada em "árabus", em 2021.[37] No mesmo ano, o Museu da Língua Portuguesa fez uma publicação usando a palavra todes.[38][39]

A Epic Games, em 2022, usou a linguagem neutra na frase “Todes são bem-vindes no Ônibus de Batalha”, para o Orgulho Royale do jogo Fortnite Battle Royale.[40]

A Ubisoft, utiliza no jogo Just Dance, desde a sua edição de 2022, o sistema elu para atingir a neutralidade de género[41].

Publicações sobre o livro infantojuvenil "No meu bairro", da autoria de Lúcia Vicente, usavam o sistema elu.[42][43] A história deu origem a uma peça de teatro em Portugal, cuja escrita usava o gênero alternativo sistematizado.[44]

A apresentadora Ana Paula Padrão usou o termo "bem-vindes" no programa MasterChef Brasil em 2023, para incluir participante de gênero não binário Will Duarte,[45] e sua fala repercutiu nas redes sociais.[46]

Referências

  1. a b Pappas, Stephanie (21 de fevereiro de 2012). «Gendered Grammar Linked to Global Sexism». livescience.com (em inglês). Consultado em 8 de dezembro de 2019 
  2. Siqueiros, Georgette (9 de outubro de 2017). «The Language of Sexism: How Gendered Language Encourages Workplace Sexism». Classy Career Girl (em inglês). Consultado em 7 de agosto de 2021. Cópia arquivada em 17 de abril de 2021 
  3. Wasserman, Benjamin D.; Weseley, Allyson J. (26 de setembro de 2009). «¿Qué? Quoi? Do Languages with Grammatical Gender Promote Sexist Attitudes?». Sex Roles (em inglês). 61 (9). 634 páginas. ISSN 1573-2762. doi:10.1007/s11199-009-9696-3 
  4. Prasad, Pallavi (12 de julho de 2019). «From 'Cunt' to 'Careerwoman': the Many Ways in Which Language Propagates Sexism». The Swaddle (em inglês) 
  5. Lindqvist, Anna; Renström, Emma Aurora; Gustafsson Sendén, Marie (16 de outubro de 2018). «Reducing a Male Bias in Language? Establishing the Efficiency of Three Different Gender-Fair Language Strategies». Sex Roles. 81 (1-2): 109–117. ISSN 0360-0025. doi:10.1007/s11199-018-0974-9 
  6. Sample, Ian (5 de agosto de 2019). «He, she, or...? Gender-neutral pronouns reduce biases – study». The Guardian (em inglês). ISSN 0261-3077 
  7. Tavits, Margit; Pérez, Efrén O. (5 de agosto de 2019). «Language influences mass opinion toward gender and LGBT equality». Proceedings of the National Academy of Sciences. 116 (34): 16781–16786. ISSN 0027-8424. doi:10.1073/pnas.1908156116 
  8. Jacobs, Tom (5 de agosto de 2019). «Using Gender-Neutral Pronouns May Reduce Sexism». Pacific Standard (em inglês). Consultado em 14 de dezembro de 2019 
  9. a b c d e f Cassiano, Ophelia (2 de abril de 2020). «Guia para "Linguagem Neutra" (PT-BR)» 
  10. «Neolinguagem: o debate acerca da busca por mais inclusão na língua portuguesa». Portal Jornalismo ESPM. 28 de outubro de 2019. Consultado em 15 de setembro de 2020 
  11. «Linguagem neutra, linguagem inclusiva, neolinguagem: do que se trata?». clicidea.com.br. 8 de setembro de 2020. Consultado em 15 de setembro de 2020 
  12. Allegretti, Fernanda (12 de fevereiro de 2016). «Amigues para sempre». VEJA. Consultado em 8 de junho de 2020 
  13. «Linguagem neutra: qual é o objetivo e o que é?». NSC Total. 2 de setembro de 2021. Consultado em 1 de setembro de 2022 
  14. Almeida, Gioni Caê (1 de janeiro de 2020). «Manual para o uso da linguagem neutra em Língua Portuguesa». Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Academia.edu. Consultado em 1 de setembro de 2022 
  15. «» Elementos de conjuntos de linguagem». orientando.org. Consultado em 4 de abril de 2021 
  16. a b «Sistema Elu, Linguagem Neutra em Género». dezanove.pt. 13 de abril de 2020. Consultado em 4 de abril de 2021 
  17. a b c «Deixando o X para trás na linguagem neutra de gênero». Batatinhas. 1 de novembro de 2014. Arquivado do original em 17 de janeiro de 2016 
  18. «"Deixando o X para trás na linguagem neutra de gênero", por Juno». PIRATAS. 31 de março de 2016. Consultado em 8 de junho de 2020 
  19. «Linguagem inclusiva e/ou neutra: o que está em causa». Gerador. 18 de julho de 2022. Consultado em 4 de janeiro de 2024 
  20. «Elus são eles e elas». Época. 16 de novembro de 2018. Consultado em 9 de julho de 2020 
  21. «Opções de identidade». SCRUFF Suporte. Consultado em 9 de julho de 2020. Arquivado do original em 13 de julho de 2020 
  22. Nascimento, Victor (30 de maio de 2018). «12 coisas que pessoas queer do Brasil gostariam que você soubesse». BuzzFeed. Consultado em 9 de julho de 2020. Cópia arquivada em 11 de julho de 2020 
  23. Carioca, Marcio (30 de junho de 2016). «Vamos usar "E" para o gênero neutro?». Lado Bi. Consultado em 9 de julho de 2020 
  24. Lau, Héliton Diego; Rodrigues, Caroline Vieira (novembro de 2019). «"Já tentei usar o pronome masculino, mas não sinto que sou eu"». Portal de Periódicos UFPB. doi:10.22478/temática.v15i11.48820. Consultado em 9 de julho de 2020 
  25. «Como a linguagem neutra evoluiu pelo mundo». Duolingo Blog. 5 de agosto de 2022. Consultado em 10 de agosto de 2024 
  26. «Nee Barros: "Eu non sinto a necesidade de definirme con etiquetas" – P(r)ensamos» (em galego). 12 de maio de 2022. Consultado em 10 de agosto de 2024 
  27. «Nee Barros: "Escribín `Identidade` para darme a min mesme un referente que eu non tivera"». www.elsaltodiario.com (em local). Consultado em 10 de agosto de 2024 
  28. «Com o tema 'LGBTI+ entre gerações', TODXS Conecta terá edição online e atrações musicais». CartaCampinas. 4 de junho de 2020. Consultado em 17 de junho de 2020 
  29. Amedola, Beatriz (22 de março de 2020). «Todxs Nós traz primeira protagonista não-binária em uma série brasileira». UOL Entretenimento 
  30. Soraia, Alves (30 de janeiro de 2020). «#ConviverTransforma - Respeita Meu Nome» 
  31. «Dicionário adota pronome para pessoas não-binárias - Café com Jornal - Vídeos - Band.com.br». Band 
  32. Lau, Héliton Diego (2017). «O uso da linguagem neutra como visibilidade e inclusão para pessoas trans não-binárias na língua portuguesa: a voz "del@s" ou "delxs"?» (PDF). Simpósio Internacional em Educação Sexual da UEM. Consultado em 9 de julho de 2020 
  33. Lau, Héliton Diego (2019). «Pensando fora do cistema: uma reflexão sobre a linguagem não-binária». Portal de Periódicos da UEPG. Consultado em 9 de julho de 2020 
  34. «'Star Trek: Discovery' Season 3 Will Introduce Non-Binary And Transgender Characters». TrekMovie.com (em inglês). 2 de setembro de 2020. Consultado em 9 de maio de 2021 
  35. Nogueira, Salvador (2 de setembro de 2020). «Discovery terá personagens não binário e transgênero na terceira temporada, revela CBS». Trek Brasilis. Consultado em 9 de maio de 2021 
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  37. Higa, Laís Miwa (14 de outubro de 2021). «O que é asiático brasileiro?». Jornal da USP. Consultado em 27 de agosto de 2024. Cópia arquivada em 17 de outubro de 2021 
  38. Banholzer, Marília (23 de julho de 2021). «"Todes"? Polêmica, linguagem neutra é defendida pelo Museu da Língua Portuguesa». JC. Consultado em 27 de agosto de 2024 
  39. «Museu da Língua Portuguesa usa 'todes' em post na internet e provoca polêmica». Folha de S.Paulo. 23 de julho de 2021. Consultado em 27 de agosto de 2024 
  40. «Levante Sua Bandeira no Orgulho Royale 2022 do Fortnite». Fortnite da Epic Games. 31 de agosto de 2022. Consultado em 1 de setembro de 2022 
  41. «Just Dance 2023 Edition - Em busca da diversão perfeita! | Project N». 6 de dezembro de 2022. Consultado em 4 de janeiro de 2024 
  42. «No Meu Bairro - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa». ciberduvidas.iscte-iul.pt. Consultado em 10 de agosto de 2024 
  43. «Inédito em Portugal: Primeiro livro infantil escrito no sistema ELU». dezanove.pt. 30 de agosto de 2023. Consultado em 5 de Outubro de 2023 
  44. Lusa, Agência. «Livro infantil "No meu bairro" dá origem a peça de teatro sobre inclusão e diversidade». Observador. Consultado em 10 de agosto de 2024 
  45. «Quem é Will Duarte, participante não-binário do Masterchef?». Terra. Consultado em 14 de junho de 2024 
  46. «Ana Paula diz que "bem-vindes" no MasterChef não é para mudar língua portuguesa». www.band.uol.com.br. 24 de maio de 2023. Consultado em 14 de junho de 2024 

Ligações externas

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