Marcha para o Oeste – Wikipédia, a enciclopédia livre
A Marcha para o Oeste foi uma política pública engendrada pelo governo de Getúlio Vargas durante o Estado Novo (1937-1945) a fim de desenvolver e integrar as regiões Centro-Oeste e Norte do Brasil que até aquele momento apresentavam uma baixa densidade demográfica, bem diferente ao que ocorria na região litorânea brasileira.[1] No início da década de 40, praticamente todos os 43 milhões de habitantes do país estavam concentrados no litoral e viam o interior do próprio país como algo exótico. A região não passava de uma enorme e inexplorada mancha na geografia brasileira.[2]
Fora isso, havia por detrás dessa política a criação de um sentimento de nacionalidade e de pertencimento dessas áreas em toda a população brasileira. A noção de "vazio" territorial atualizava o conceito de "sertão", entendido como um espaço abandonado que desde as denúncias de Euclides da Cunha vinha preocupando as elites brasileiras interessadas em construir uma nação.[3]
Contexto
[editar | editar código-fonte]Para tal empreendimento, Vargas precisava conhecer bem o território a ser integrado, assim, criou-se uma série de entidades com o intuito de produzir informações para o desenvolvimento das ações do governo, como o Conselho Nacional de Geografia, o Conselho Nacional de Cartografia, o Conselho Nacional de Estatística e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), este de 1938[4]. Essas agências ajudariam o Estado a formular e implementar suas políticas destinadas a vencer os "vazios" territoriais e a pouca interação da rede urbana.[3]
A forma de integração entre as regiões e as cidades que o governo federal optou naquela ocasião foi o transporte terrestre, portanto, a criação em 1937 do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER) indica sem dúvida a importância das estradas como instrumento de comunicação entre as regiões e as cidades.[3]
Foi assim que, em 1940, Vargas lançou a chamada "Marcha para o Oeste", como uma diretriz de integração territorial para o país. E o fez durante os festejos de inauguração da cidade de Goiânia.[3] Segundo Vargas, o Brasil era uma "unidade política", mas não uma unidade econômica:
Continuam, entretanto, os vastos espaços despovoados, que não atingiram o necessário clima renovador, pela falta de toda uma série de medidas elementares, cuja execução figura no programa do Governo e nos propósitos da administração, destacando-se, dentre elas, o saneamento, a educação e os transportes. No dia em que dispuserem de todos esses elementos, os espaços vazios se povoarão. Teremos densidade demográfica e desenvolvimento industrial. Desse modo, o programa 'rumo ao Oeste' é o reatamento da campanha dos construtores da nacionalidade, dos bandeirantes e dos sertanistas, com a integração dos modernos processos de cultura. Precisamos promover essa arrancada, sob todos os aspectos e com todos os métodos, a fim de suprimirmos os vácuos demográficos do nosso território e fazermos com que as fronteiras econômicas coincidam com as fronteiras políticas. Eis o nosso imperialismo. Não ambicionamos um palmo de território que não seja nosso, mas temos um expansionismo, que é o de crescermos dentro das nossas próprias fronteiras.[5]
A realização da marcha, além de conquistar o apoio da população contou com a ajuda de empresários paulistas que fizeram doações às diversas expedições para reconhecimento do solo convencidos pelo discurso nacionalista, de relembrar as bandeiras dos séculos passados. A lembrança das bandeiras serviu de inspiração para diversos participantes da Marcha ao sertão. Inclusive em várias propagandas da época, nota-se a retomada do mito da colonização. Era como se o Brasil estivesse sendo recolonizado por Vargas.[6] A colaboração intelectual ao programa de Getúlio Vargas contou com uma publicação do poeta paulista Cassiano Ricardo intitulada Marcha Para Oeste: a influência da bandeira na formação social e política do Brasil, editada em 1940. Era uma versão mítica do Estado Nacional, em que Cassiano faz uma analogia entre a organização das bandeiras (século XVI) e a do Estado Novo.[7]
A ação política concreta do Estado Novo se fez sentir com a criação dos territórios federais em 1943: Amapá, Rio Branco (atual Roraima), Guaporé (atual Rondônia), Iguaçu e Ponta Porã. O governo federal atuou também na região de colonização do norte do Paraná, o que deu origem a uma série de novas cidades como Londrina, Maringá, Cianorte, Umuarama.[3]
Destaca-se dentro da "Marcha para o Oeste" também a Expedição Roncador-Xingu que foi planejada para conquistar e desbravar o coração do Brasil. Iniciada em 1943, o movimento adentrou o Brasil-Central, desvendou o sul da Amazônia e travou contato com diversas etnias indígenas ainda desconhecidas. Uma epopéia sensacional, que entrou para a História como das maiores aventuras do século 20 em todo o mundo. Na liderança, três irmãos que marcaram este período da história nacional: Leonardo, Cláudio e Orlando Villas Bôas.[2]
As linhas mestras da "política territorial" - políticas de povoamento, regulando o deslocamento populacional, de transporte e de comunicação - do governo Vargas seriam retomadas posteriormente por Juscelino Kubitscheck. A construção de Brasília pode ser entendida como uma nova "Marcha para o Oeste", já que deslocou populações (os chamados "candangos", principalmente migrantes nordestinos) para os sertões e possibilitou que os equipamentos da vida urbana chegassem a uma região que os desconhecia. Mais que isso, levou o poder central para o interior e serviu para iniciar um processo de deslocamento da modernização brasileira do Centro-Sul para o Centro-Oeste.[3]
Referências
[editar | editar código-fonte]- ↑ «Marcha para o oeste do Brasil - História». InfoEscola. Consultado em 5 de junho de 2020
- ↑ a b «A Marcha para o Oeste – A maior aventura do século 20 – Rota Brasil Oeste». Consultado em 5 de junho de 2020
- ↑ a b c d e f «A conquista do oeste | CPDOC». cpdoc.fgv.br. Consultado em 5 de junho de 2020
- ↑ Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil, CPDOC. «Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)». Fundação Getúlio Vargas. Consultado em 4 de junho de 2020
- ↑ ROCHA, L.M. (1992). «A marcha para o Oeste e os índios do Xingu» (PDF). Ministério da Justiça. Boletim da FUNAI. Consultado em 11 de setembro de 2024
- ↑ Arrais, Matheus Eurich (2016). «A MARCHA PARA O OESTE E O ESTADO NOVO: A CONQUISTA DOS SERTÕES» (PDF). Universidade Nacional de Brasília: Artigo de conclusão de curso (graduação em História). Consultado em 4 de junho de 2020
- ↑ Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil, CPDOC. «Cassiano Ricardo». Fundação Getúlio Vargas. Consultado em 4 de junho de 2020
Ligações externas
[editar | editar código-fonte]- A conquista do Oeste acessado em 6 de agosto de 2008